domingo, 4 de novembro de 2007

O amor (surge) no ônibus.

O trânsito era mais do que insuportável, e todo mundo se perguntava se o inferno era muito distante, em anos ou distância, tanto faz.
É praxe que no busão as mulheres idosas, as mulheres com crianças de colo e mesmo as simplesmente mulheres tenham preferência para sentar-se. Enquanto isso, os caras ficam admirando a Marginal Pinheiros e o trânsito (que nada tem de belo). Alguns admiram o material humano sentado, mas fica só na instiga mesmo, nos desejos retraídos. Alguns tentam ler e outros tentam conciliar uma música no ouvido através dos mp3s chineses com as duas visões: as paisagens de fora e as de dentro. E ainda outros perseguem o infinito, poderiam estar dormindo que não faria a menor diferença.
Era o caos, em verdade todos pareciam estar fugindo de uma catástrofe natural e chegar o quanto antes à seus lares, era uma fuga em massa da civilização do trabalho para chegar ao conforto do sofá, da janta e do alívio dessa vida. Quanto mais subúrbio melhor, a impressão era a de que uma bomba atômica explodiria no centro da cidade. Quanto mais subúrbio, melhor. O alívio da província. Mas o cenário era caótico e aterrador: quem não soubesse o que era desespero, poderia ver uma ilustração neste cenário.
Uma criança chama a atenção. Estava no colo da mãe, sentada em um assento. Em verdade, a mãe era uma maravilha, jovem e fresca. Mas o seu bebê estava chamando a atenção muito mais do que a própria mãe, depois de um tempo. Talvez o único sorriso sincero, desprendido de qualquer desespero: o sorriso da criança era um pedaço de alívio temporário, um estímulo ao lar, que ainda demora a vir; não compreende o mundo à sua volta, toda aquela bagunça, o horário de pico da volta à casa, o trânsito caótico e milimétrico, o calor tropical e urbano, os sonhos os mais distantes possíveis. Não compreende, e é melhor que não compreenda mesmo. Há a esperança de que seu mundo seja diferente, no auge de sua maturidade, e que seus sorrisos não sejam em vão.

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